Os desastres climáticos têm evidenciado a necessidade de investimentos significativos na produção habitacional para atender às demandas das famílias que perderam suas casas. Essa urgência se soma ao grande déficit habitacional já acumulado no Brasil.
Nos últimos anos, enfrentamos severas restrições nas políticas públicas de habitação, com programas como o Minha Casa Minha Vida paralisados e investimentos para as famílias mais pobres praticamente inexistentes. Atualmente, estamos em um momento de retomada, não apenas pelas políticas públicas federais, mas também pela necessidade imposta pelas tragédias ambientais, como as que ocorreram recentemente no Rio Grande do Sul.
A Importância da Autonomia das Famílias
É um excelente momento para relembrar um tema fundamental e frequentemente negligenciado pelos governos nas últimas décadas: a construção da autonomia das famílias em situação de vulnerabilidade.
Os programas habitacionais devem incorporar políticas complementares à entrega da casa, como oportunidades de trabalho e renda, acesso à saúde, educação e cidadania. Essa abordagem é semelhante ao modelo Housing First, que prioriza a habitação como o primeiro passo na oferta de serviços para a população em situação de rua.
A Relevância do Trabalho Social Pós-Ocupação
O Trabalho Social Pós-Ocupação é tão importante quanto a casa. Sem esse acompanhamento, não há conjunto habitacional que consiga resistir à vulnerabilidade das famílias ou à falta de gestão. No Brasil, existem centenas de exemplos de conjuntos habitacionais entregues há mais de 10 anos que se encontram em estado de degradação acelerada. Essa deterioração é frequentemente observada em empreendimentos onde não foi implementado um trabalho social para garantir a autonomia das famílias, promover a geração de trabalho e renda que as tire da linha da pobreza e onde não há gestão condominial.
Dados recentes indicam que a taxa de inadimplência do programa Minha Casa, Minha Vida alcançou um recorde de 45% de pendências em pagamentos em 2022. Observamos também dois conjuntos habitacionais entregues em 2013: o Residencial do Pilar, em Recife, pelo PAC; e o Conjunto Edgar Gayoso, em Teresina, pelo Programa MCMV. Uma pesquisa comunitária realizada em ambos os conjuntos revelou que cerca de 90% das famílias do Pilar possuem renda inferior a um salário mínimo, enquanto 90% das famílias do Edgar Gayoso têm renda inferior a dois salários mínimos. Situações de extrema pobreza, identificadas em habitações formais, são recorrentes em várias localidades.
O Papel do FICA na Transformação Habitacional
O FICA foi criado como uma alternativa à oferta de habitação no centro de São Paulo, baseado no modelo da Locação Social. Nesse modelo, as famílias pagam um valor acessível para morar com dignidade e segurança, além de receber acompanhamento social contínuo para a conquista de sua autonomia.
As pesquisas mencionadas estão disponíveis em urbancoalitions.org e são produtos do projeto Alianças pela Transformação Urbana, coordenado pelo WRI Brasil e pela United Nations University – Institute for Environment and Human Security (UNU-EHS).